segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Show de encerramento do dia dos pais

O dia dos pais é mais importante pra mim do que o meu aniversário.
É verdade que nunca gostei de comemorar aniversário, mas também colocaria o dia dos pais muito acima de qualquer outra data festiva. Pois, nada se compara ao segundo domingo do mês de agosto.
Aqui está o Filhosofias que não me deixa mentir.

A gente já tinha assistido ao "Música de brinquedo" no SESC de Rio Preto, porém a chuva torrencial, a hora adiantada, a febre incessante (do João) e o público em excesso estragaram o espetáculo. Hoje não, estava tudo impecável, como registra este video:



Hoje, depois de eu invocar meu direito (como "pai do dia") de escolher aonde iríamos jantar quando acabasse o show do Pato Fu no Parque da Cidade, o Antônio me perguntou quando é que seria o "dia dos filhos". Como se todos os dias não fosse...
Bom, quanto a este dia dos pais só faltou mesmo o meu pai. Queria muito ter podido abraçá-lo e passar o dia ao seu lado, junto com meus filhos.
Por isso, decidimos que da próxima vez que viajarmos para Catanduva será, novamente, dia dos pais. Pelo menos do meu.

sábado, 6 de agosto de 2011

Eles cantam no chuveiro

A gente vive se perguntando se nossos filhos são felizes, se serão felizes e se terão filhos felizes e etecétera e tal.

Sei não. Também tenho as minhas dúvidas.

Mas que eles soltam a voz no banho, ah isso eles fazem!

Uma lágrima de amor

Em outubro do ano passado escrevi sobre o parto do João Pedro. Postei uma foto registrando o exato momento em que nos reconhecíamos como pai e filho, olhos nos olhos.

De lá pra cá, ao longo de seus sete anos de vida, vivemos outros tantos momentos de intensa cumplicidade. Sempre decorrentes de um gesto discreto e comovente do João. Assim, espontâneamente, como por encanto, o meu filho "faz algo", cria um momento mágico que me envolve completamente, me arrebata.

Na maioria das vezes estamos só nós dois. E, por isso, depois da chegada triunfal do Tunico Pinico e da marcação cerrada que ele impôs sobre mim, admito que são menores as chances que tenho com o João.

Mas hoje, finalmente, aconteceu de novo. Estávamos os três na sala brincando de playmobil quando comecei a cantar uma versão adaptada daquela música do Vinicius: "Menininhos do meu coração, fiquem pequeninhos na minha canção, companheiros levados, batendo palminhas, fugindo assustados do bicho-papão...".

De repente, olhei para o João Pedro e ele estava me encarando com ternura.

Surpreso, perguntei: "O que foi filho?"

E ele respondeu: "Não sei papai... Que bonita essa música. Foi você que fez?"

"Não filho, não fui eu quem fiz, mas desde que você nasceu inventei um novo jeito de cantá-la", expliquei.

Aí, "plim", ele fixou os seus olhos (marejados) nos meus e derramou uma lágrima.

Senti meu coração pulsando juntinho com o dele quando o abracei. Foram alguns segundos de uma harmonia preciosa até que o Antônio pulasse nas minhas costas e exigesse minha atenção.



Agora me dei conta que deveria ter recolhido aquela lágrima de amor, porque tenho certeza que ela teria o poder de cicatrizar até as chagas de Cristo. No entanto, se foi, rapidamente passou; aliás, como passa a vida.

domingo, 31 de julho de 2011

Comentando comentário - saudades e esperança

Hoje, enquanto os meus pais arrumavam as malas pra voltarem a Catanduva (depois de um fim de semana afetivamente intenso aqui conosco em Brasília), o Antônio "nos comunicou" que também voltaria com o vovô e a vovó.
Desde ontem ele vinha tentando convencer seus avós a ficarem mais uns dias. Argumentou de todas as maneiras: chegou até a orientar minha mãe sobre como fazer para organizar à distância o trabalho na Loja.
Então,quando ele percebeu que não poderia fazê-los ficar, não hesitou e tomou a decisão de voltar pra sua antiga casa.
Nunca foi tão difícil demovê-lo.
Sobretudo, porque compreendo e reconheço perfeitamente os motivos que o levaram à decisão de voltar. Cito apenas dois (pra não chorar): aqui ele não tem nem dez por cento da liberdade que tinha em Catanduva e, pra piorar, ainda não tem amigos. Foi duro ouví-lo dizer, aninhado em meu colo, que "precisava voltar porque senão ia esquecer os nomes dos seus amigos". Respondi que ele poderia ligar para eles e vê-los pela internet, mas ele retrucou de forma incisiva me dizendo que "não queria falar, mas brincar com seus amigos".

Li o comentário da Sandra e me lembrei (mais uma vez) daquela música do Peninha (ou do Caetano?) chamada "Sonhos" que diz assim: "Ter saudade até que é bom, melhor do que caminhar sozinho. A esperança é um dom que eu tenho em mim. Eu tenho sim".
Acho que vou ter que repetir na frente do espelho como no terço bizantino: "eu tenho sim".

Mas vou esperar (de esperança) até amanhã à noite quando encontrá-los em casa depois do primeiro dia de aula na Moara.

Boa noite, meninos.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Saudades de menino

Depois do Antônio quase me matar (de remorso?) há duas semanas ao me dizer, meio ensimesmado, que estava com saudades de seus amiguinhos, hoje, enquanto oferecia aos meninos a última refeição da noite, o João Pedro me mostrou uma caixa, parecida com as antigas caixas de sapatos, atada com uma fita branca com a qual ele também prendeu uma tulipa de plástico.

"É um presente, meu filho? Para mim?", perguntei.

 "São vários presentes que vou mandar para o Gui lá em Catanduva", ele respondeu.

E foi logo desatando o nó para me mostrar o que havia dentro. Retirou uns dez pequenos brinquedos, inclusive um chaveiro com bússola que eu lhe dera de presente.

"Mas por que você vai dar isso tudo pro Gui? Até o seu chaveiro?", questionei.

E ele, com aquele jeito doce e generoso que é só dele, me disse que era "pra agradecer a amizade que eles tiveram" e, quanto ao chaveiro-bussúla, respondeu-me que podia usar o do Antônio.

Reagi dizendo que a amizade entre eles não havia acabado, porque amigo de verdade é amigo pra sempre e em qualquer lugar.

Mas fiquei comovido mesmo quando ele me mostrou o bilhetinho escrito para acompanhar a caixa: "Gilherme eu juão te mando um abrassauo. estou com saudades e fala para leticia que eu amo ela fim".

Só não me desfiz num choro torrencial, porque a estiagem anda tão braba por aqui que deve ter desidratado meu coração.

Ainda bem que os meninos têm um ao outro:

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Reza de cabeça e "cébelo"

Ontem a noite a Mi convocou os meninos pra reza que, religiosamente, antecede o sono.
Como são várias as orações e eles estavam realmente cansados, nem bem ela começou com o Pai-Nosso, o João Pedro foi logo avisando: "Eu vou rezar de cabeça". Quer dizer, pra bom entendedor, vou ficar quietinho ouvindo a mamãe entoar a sua longa ladainha.
O Antônio pra não ficar atrás e o por baixo disse em seguida: "E eu vou rezar com o cébelo".

terça-feira, 12 de julho de 2011

O Mônico, o dono da rua e o complexo de Édipo

Ainda em Catanduva os meninos começaram a me chamar de Mônico, a versão masculina-adulta-paterna da Mônica do gibi.
Um pouco instigados pela mãe (que é capaz de perder o marido, mas não a piada) e outro tanto pelas reais semelhanças, o fato é que o apelido pegou. Também ajudei a emplacar a alcunha fazendo de conta que fico furioso com a brincadeira: corri atrás, fiz cócegas e dei até coelhadas (eles têm um Sansão).
Agora não tem mais jeito. Para o porteiro, para a faxineira, para o entregador de jornal, para o garçom do restaurante da CGU, enfim, para todo mundo que o João Pedro e o Antônio tiveram a chance de me apresentar aqui em Brasília já sou o Mônico.
Dentuço ainda vá lá (no fundo gosto), baixinho nunca (difícil admitir, mesmo depois de casado), gordinho talvez (na barriga), agora o que não resta dúvida é que para os meninos subi de posto: saltei de manda-chuva do pedaço para o dono da rua.
Provavelmente foi a conclusão a que chegaram depois da mudança por "causa do papai".
O lado bom é que os dois se sentem seguros comigo, com o Mônico, forte e imabtível. O lado "ruim" é que eles, agora, vivem me desafiando e bolando planos mirabolantes pra me destronar.

Laio que se cuide. Afinal, quem mandou desposar Jocasta e ainda por cima fazer dois Édipos com ela?

domingo, 10 de julho de 2011

Memória de criança

Quantas vezes não sentimos um cheiro que nos remete imediatamente a uma situação vivida (ou mesmo um lugar) em nossa infância?
Para mim até hoje o Natal é o cheiro de uma árvore que tinha aos montes perto da casa de minha avó na Vila Cardia em Bauru, no entorno da rua Ezequiel Ramos.

No sábado, foi a vez da memória do João falar mais alto. Fomos levar os meninos para conhecer a Moara no novo endereço (703 Norte).
Assim que entramos na escola, que é bastante diferente da outra Moara do Lago Norte, o João Pedro me puxou pela mão e disse: "É tudo muito diferente, mas o cheiro é o mesmo!"

Contei pra Deide, que foi professora do João e será do Antônio, e ficamos todos emocionados.

I-n-c-o-n-f-e-s-s-á-v-e-i-s (o que os pais pensam, mas não tem coragem de dizer)

Na quarta-feira passada, um dia depois de se consumar nossa mudança para Brasília, o Antônio me disse, enquanto ele fazia cocô e conversávamos sobre a vida (como de costume), que estava com muita saudade do Colegião.
De bobeira eu ainda perguntei: "Mas, é saudade de Catanduva ou apenas de algum amiguinho em especial?".
"Ah, papi, de todo mundo, mas mais do João Galera", repondeu sinceramente.

Aí, pela primeira vez, me dei conta que a melhor opção para minha família era verdadeiramente minha morte.
Sempre fiz piada com isso. Vira e mexe acabava dizendo pra Mi que caso eu morresse ela ficaria muito melhor: sem mim, com pensão integral e ainda morando com os pais em Catanduva.
Entretando, nunca havia levado a sério essa brincadeira mórbida.
Até perceber o quanto nossa grande família (avós, tios, primos e amigos) é necessária para a felicidade dos meninos.
Fiquei derrubado.
Pensei numa alternativa menos drástica -- como ficar tetraplégico, me aposentar e irmos todos morar definitivamente em Catanduva --, porém, somente com a morte eu me transformaria numa solução, em absoluto.

Bom, de lá pra cá, quatro longos dias se passaram e para minha alegria a Mi já me diz que está muito feliz com o novo apartamento (apesar da vizinhança), as professoras da Moara nos receberam de braços e corações abertos, o Antônio voltou a dizer que somos irmãos gêmeos e o João Pedro já parou de roer unha.

É... tudo indica que viverei mais uns anos.

domingo, 26 de junho de 2011

Aniversário!

A vida com os filhos é mesmo assim. A gente vai amando e cuidando um dia após o outro e, de repente, nos damos conta que eles cresceram rápido demais e que já caminham com alguma segurança e autonomia.

Antes dos meninos, isto é, antes de ser pai, aprendi (com minha mãe, principalmente) que o tempo não para e que devemos aproveitar cada minuto da infância de nossos filhos. Porque, quando menos esperamos, já não temos mais crianças, restam-nos homens e mulheres feitos.

Só não sabia que com blogs as coisas também aconteciam desse jeito. Pois, agora há pouco, estava dando uma volta lá pelas primeiras postagens quando me deparei com a Lições de Filhosofia postada em 16 de junho de 2010. Caramba! O Filhosofias já completou seu primeiro ano de vida.

Como um blog acho que posso dizer que ainda engatinha, mas se movimento quase que por vontade própria. É sério. O Filhosofias não é somente o produto daquilo que tenho a dizer sobre crianças, filhos e tudo mais. Tem muito texto que escrevo que não consigo postar aqui, ou melhor, que não cabe aqui. E, por outro lado, a maioria das postagens não poderia ser lida noutro contexto.

Atribuo grande parte da responsabilidade pelo fato do Filhosofias ter movimento autônomo ou pulsação independente às pessoas que acessam as postagens e, depois, escrevem  e-mails e/ou comentários. O mais legal é isso. O Filhosofias acaba conectando pessoas em diferentes lugares, vivendo realidades e situações bastante distintas; talvez com um único ponto em comum: o amor incondicional pelos filhos, os nascidos e os que virão.

As estatísticas do blog registram acessos vindos de todo Brasil, de Portugal, dos Estados Unidos, da França, do Canadá, da Holanda, da Alemanha, da Itália, da Áustria, do Reino Unido, da Suécia, da Rússia, da Hungria, do Japão, da Noruega e de Cingapura.

Portanto, quero agradecer a todos pelo estímulo e, sobretudo, pela companhia. Ainda que a gente nunca venha a se encontrar, dá uma quentura no coração saber que vocês estão aí e que seguimos juntos nesse imenso desafio de fazer um mundo melhor para e com os nossos filhos.
 
Sintam-se abraçados, de verdade.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

aFoRiSmOs - Xixi em inglês é "one"

Este foi a Mi quem me contou.

Na saída do cinema, o João e seu amiguinho iam entretidos com o planejamento de cada brincadeira que fariam, juntos, tão logo chegassem em casa.
Aí, talvez querendo apressá-los um pouquinho, a Mi suspirou e disse: "Nossa, que vontade de fazer xaixai".
O Caio, no mesmo instante, perguntou: "O que é xaixai, Tia Mi?".
Ela esclareceu: "É vontade de fazer xixi, mas queria usar uma palavra mais discreta. Pensei em dizer xixi em inglês, mas como não sei, inventei 'xaixai'".
O João então pensou um pouquinho e respondeu: "Eu sei como se diz 'xixi' em inglês".
E a Mi duvidou: "Sabe?"
"Xixi em inglês é 'one'", sentenciou o João.
"Como, João?", a Emiliane questionou sem entender o que ele havia dito.
Ele então reiterou: "One. [Ora] Você não diz que cocô é 'number two', [logo] xixi só pode ser número um".

domingo, 19 de junho de 2011

Independente futebol clube

Não se enganem, a camisa da foto não é da seleção brasileira. É do único e verdadeiro time do coração de qualquer molequinho de 4 anos: o glorioso independente futebol clube.


Já o jogador... é um velho conhecido de todos nós: o fabuloso Tunico Penico.
O lance que vou narrar aconteceu hoje pela manhã.
Essa figurinha aí entrou no escritório, onde estava escrevendo a postagem anterior, e me pediu uma tesoura.
"Por que, filho?". Sem hesitar: "Para eu cortar o papel desenhado".
"Tudo bem", pensei. Afinal, estavam os dois na sala desenhando e pintando havia já meia-hora.

Dez minutos depois lá vem o craque com uma cara de safado, com a franja cortada e um tufo de cabelo nas mãos.


Primeiro eu disse: "Mas é um malucão". Depois admiti: "Ficou bonito!".
Reparem bem na irregularidade do corte. Além de iniciativa, tem estilo, não?


Tempo do abandono desolado de menino

Já contei aqui algumas passagens daquele período, em 2009, no qual (sobre)vivi entre Brasília e Catanduva sem a Mi e os meninos. E pior do que a "separação", foi viver durante meses sem qualquer perspectiva de que pudéssemos novamente passar a semana toda (e não só os fins de semana) juntinhos.

Meu cunhado, que me levava a Rio Preto para pegar o ônibus aos domingos a noite, ainda hoje diz que ficou de coração partido (e compreendeu o nosso drama) quando presenciou os meninos aos prantos, abraçados à perna da Mi na escada do Prédio, pedindo que eu ficasse.

Eles choravam sentidos, profundamente. Mas era eu o menino abandonado e desolado.

Agora, não nos sentimos mais assim. Como diz a música, "ter saudade até que é bom, melhor do que caminhar sozinho". Temos saudades, muita e de doer. Mas temos, principalmente, perspectiva de futuro. Isso é fundamental. Sem a presença constante e rotineira do amor entre pais e filhos fica difícil manter uma família, mas sem futuro, isto é, sem que consigamos ao menos projetar a convivência familiar para "depois" (quem sabe amanhã ou em breve ou no ano que vem...) sequer é possível  pensar em família.

Muito em breve estaremos todos juntos, novamente, vivendo no PlanaltoCentral.

Ainda hoje vou ouvir mais uma vez o Antônio me pedindo pra ficar e, depois, me dizendo que eu não posso viajar sem antes fazer tudo o que combinamos (a lista de brincadeiras e atividades nunca acaba). E quando digo que não dá mais tempo, ele fala que eu o enganei (na segunda, amanhã, é a primeira coisa que me dirá ao telefone). O João, por outro lado, me abraça o tempo todo e de tardezinha se aninha no meu colo feito um gatinho ressabiado. Contudo, ambos sabem -- do alto de seus 4 e 7 anos -- que eu sempre vou voltar, que eu nunca vou deixá-los e que daqui a pouco virei buscá-los para mais uma aventura.

O tempo do abandono desolado de menino é passado. Porque o grande amor é presente e, para nós quatro, é o futuro também.

domingo, 12 de junho de 2011

A herança da geração "pescoço de frango"

            O personagem principal desta estória, Laurindo Barbosa, é bisavô de um grande amigo. Completou em janeiro último cento e sete anos, fazendo questão de dizer que mesmo tendo perdido a virilidade não perdeu a lucidez. Depois de conhecê-lo e ouvi-lo falar cheguei a pensar que ele poderia ter se inspirado na resposta que aquele velho homem do livro Emílio de Rousseau oferece ao Rei Luis XV, quando questionado sobre o século de sua preferência: “Senhor, eu passei minha infância reverenciando os velhos. Sinto-me forçado a passar minha velhice reverenciando as crianças”. Mas seu bisneto, que realmente é meu amigo, garantiu-me que ele sempre foi um homem simples, um enfermeiro prático sem qualquer erudição.
Laurindo Barbosa gosta de provocar os mais moços, isto é, todo mundo, dizendo que nos últimos cem anos nada mudou. E antes que alguém esboce qualquer reação apresenta o seu testemunho como prova. “Mas não se trata apenas do testemunho ressentido de um velho”, diz ele. “É a história de toda uma geração, da ‘geração pescoço de galinha’” arremata.
Começa sua narrativa pedindo aos seus ouvintes que o acompanhem num retorno ao passado. Na verdade, um retorno ao raiar do século XX, à sua infância em Ribeirão Preto no Estado de São Paulo, onde viveu com sua família até se mudar para Catanduva em meados daquele século.
Mais precisamente, um retorno a um almoço de domingo quando, ainda criança, sentava-se à mesa com seus numerosos familiares. Nesse momento Laurindo Barbosa interrompe seu relato para indagar de forma abrupta seus ouvintes: “— E o que é que se servia aos domingos à refeição de todos os parentes?” Sem aguardar pela resposta, ele diz: “— Isso mesmo, frango assado e macarrão!”.
Mesa posta, cada coisa e cada um em seu devido lugar, Laurindo nos convida a observar atentamente como se dá a distribuição do frango em sua família; sim, apenas da galinha, porque o macarrão era (“como ainda hoje o é”, ele ressalta) distribuído sem restrições à cor, ao gênero, à religião e à idade do comensal. Interessa investigar a repartição e distribuição da galinha.
Laurindo faz uma pequena pausa para olhar para cada um de seus interlocutores e, então, indaga: “Quem é capaz de dizer em qual prato será depositada a porção de carne mais nobre da galinha, o peito?”.
Se alguém se arrisca e responde que é no prato do pai, Laurindo abre um sorriso para dar os parabéns a todos e segue contando sua estória com mais empolgação. Agora se a resposta não for essa ou se ninguém responde, ele fecha a cara e ameaça parar com o relato porque ninguém está verdadeiramente interessado em ouvi-lo (só depois de muita insistência e bajulação é que ele continua).
“E por que para o pai?”, pergunta. Ele mesmo explica: “Ora, é o pai quem responde pelo sustento da casa, pelo provimento dos familiares, ele é o chefe da mais fundamental estrutura da sociedade, é a garantia presente de bem-estar para todos aqueles que de seu trabalho dependem”.
Prosseguindo na observação, pode-se ver para quem vai o segundo pedaço da galinha (provavelmente, uma coxa): trata-se do varão, do primogênito que se ainda não trabalha com o pai logo mais estará com ele ganhando o “pão com o suor de seu rosto”. E depois do pai e do irmão mais velho do narrador, quem recebe a outra coxa da galinha? Quem disser que é a mãe do Laurindo Barbosa ainda não conseguiu se transpor para o contexto social anterior à vigência do Código Civil de 1916.
De fato, o terceiro contemplado é o avô. “Surpresos?”, pergunta Laurindo Barbosa encarando-nos. Ele esclarece então que, há cem anos atrás, o velho tinha uma importância inquestionável na sociedade: era, senão o maior, um dos grandes responsáveis pela manutenção e reprodução das tradições que garantiam a estabilidade das expectativas sociais e a integração entre as pessoas.
Após o avô é que finalmente a mãe fazia seu prato: comia, talvez uma das asas e os nacos de carne resultantes das divisões anteriores. “Claro”, diria Laurindo se a ele interessasse uma análise jurídica daquela ceia: depois do principal segue sempre o acessório, tal como determinava a legislação daquele tempo; isto é, tendo saciado o macho pode a fêmea se saciar.
Seguia-se a distribuição da galinha às crianças da família em ordem decrescente: das mais velhas às mais novas. É neste momento que se pode visualizar com nitidez a presença de Laurindo Barbosa de calças curtas e com o prato esticado para receber, por fim, seu pescoço de galinha. Sem discutir as peculiaridades da condição de “caçulinha”, sobrava para o protagonista o pedaço considerado de menor prestígio, indicando, portanto, seu lugar, ou melhor, o lugar da criança na sociedade daquela época.
Pode parecer estranho a muitos, mas naquele contexto sócio-cultural a criança era tão somente um projeto de gente, uma possibilidade de pessoa. Por isso que o Ordenamento Jurídico não lhe conferia a titularidade de direitos. Às crianças aplicava-se a tutela dos pais (o chinelo e o marmelo) e, quando não bastava, cabia ao Estado aplicar o código de menores. Para evidenciar esta sub-condição social da criança convém lembrar da denominação atribuída (até hoje) à escola infantil anterior ao ensino fundamental: jardim da infância, porque é no jardim que se deve plantar as “sementinhas de gente” que, um dia, germinarão a florescerão como sujeitos plenos de direitos e responsabilidades.
Realizado o flash-back descrito acima, Laurindo Barbosa atualiza a cena de domingo, colocando seu leitor à mesa de sua família diante da panela de macarrão e da travessa contendo o galináceo, desta vez, já destrinchado. Mais uma vez, chama atenção para distribuição da galinha e, conseqüentemente, para organização social que tal partilha indica.
Hoje, terceiro milênio, transcorridos mais de um século daquele outro almoço em Ribeirão Preto, não há dúvidas de que para a seguinte pergunta haverá uma única resposta: quem recebe a galinha em primeiro lugar?
Laurindo fique feliz da vida por ouvir a maioria responder em coro e sem hesitar: a criança. Sinal de que prestamos atenção na estória.
Hoje em dia pode-se verificar que em qualquer família, rica ou pobre, as crianças comem antes mesmo que o pai. Nem precisam se sentar à mesa; comem vendo televisão. Apenas depois das crianças são servidos os demais, em condições de igualdade. Com exceção dos velhos que, face ao ocaso das tradições, foram relegados à condição de sujeitos improdutivos, de obstáculos à estabilização das contas públicas. E, assim, os velhos acabam ficando com pescoço de galinha. Do mesmo modo que ficavam as crianças há um século atrás. Daí porque Laurindo Barbosa diz que sua estória é a história de toda uma geração que ele denomina “geração pescoço de galinha”: quando criança comeu do pescoço e agora, como velho, continua a comer dessa mesma carne; dois momentos de uma única condição, a sub-cidadania.
Embora não fale em sub-cidadania, Laurindo termina seu testemunho enfocando a marginalização do velho na sociedade. E sem dizer mais nem uma palavra, permanece por alguns instantes com o olhar fixo no horizonte até que seus olhos se encham d’água sensibilizando todos a sua volta.
Meu amigo jura de pé junto que seu bisavô é tratado como um rei na família e que seu relato é a denúncia da situação em que vivem os demais velhos da vizinhança, do país. O resto é mise-en-scène.
Voltando um pouco atrás na narrativa, interessa-me sublinhar a mudança radical de posição vivenciada pela criança nos últimos cem anos. Entretanto, para vislumbrar e depois compreender essa inversão extraordinária da condição da criança (que parece ter atingindo o auge no século XX), é necessário ver além da carne de pescoço depositada no prato. Do contrário, nada terá mudado.
Assim, a partir desse relato, podemos entender porque as crianças têm prioridade absoluta à mesa e em quaisquer outras situações. Por conseqüência, poderemos compreender o texto do artigo 227 da Constituição Federal de 1988 que expressamente diz: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

A compreensão paradigmática do texto e do contexto

Mas, por que houve esta mudança?
Impossível identificar a totalidade de fatores e relações que promoveram tamanha transformação. Todavia, pode-se apontar alguns entendimentos que sustentam a conexão entre o lugar que a criança ocupa nesta sociedade (contexto) e a condição de sujeito de direito a que foi alçada pela legislação, sobretudo, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (texto). Philippe Ariès (1981) produziu um dos estudos mais robustos sobre o surgimento da infância, investigando a formação histórica da família na França entre o fim da Idade Média e o início da Modernidade. As informações que ele oferece sugerem que a criação da infância é resultado de uma diferenciação funcional da sociedade (a essa altura já percebida como um sistema) que, por sua vez, resulta de uma progressão moral da humanidade. Desta forma, com base nas considerações de Ariès e nas considerações críticas de Bobbio sobre a questão kantiana do “constante progresso para melhor”, parece correto afirmar que os textos normativos modernos marcam/assinalam cada estágio desse processo constante — para não dizer progresso — de complexificação social (do qual o texto constitucional citado é o exemplo por excelência).
Por isso, se a criança é percebida como o futuro do país, sobre a qual se depositam as expectativas sociais e os projetos individuais de uma vida melhor, nada mais coerente do que protegê-la e promovê-la; pois, todos nós entendemos que o desenvolvimento das crianças resulta na realização de cada um. A criança só pôde ser priorizada como sujeito de direitos no texto da Constituição porque era, em 1988, e ainda é prioridade em nossas vidas seja qual for o contexto. Ao longo dos anos fomos nós, os adultos, que decidimos garantir à criança o que comemos de melhor, o que vestimos de melhor, o que sabemos de melhor e etc.




PS: Em 2003, eu contei essa estorinha pela primeira, com algumas poucas diferenças, em minha dissertação de mestrado. No ano passado resolvi repetir a narrativa em minha tese de Doutorado. Porque, sempre quando posso contá-la, as pessoas costumam me dizer (depois) que a estória é esclarecedora. No dia 10 de junho, sexta-feira, repeti a dose na Conferência de abertura do Fórum Permanente de Empreendedorismo e Inovação da UNICAMP e, para a minha grata surpresa, a maioria dos presentes parece ter gostado muito. Espero com essa postagem poder demonstrar um pouco mais o quanto fiquei feliz com a oportunidade do encontro com os participantes do referido Fórum. Obrigado, em especial, à Sandra, à Ana Beatriz e à Carina.

PS2: Em tempo: na verdade o Laurindo Barbosa era o meu bisavô, avô de minha mãe. Mas que, na prática, foi meu avô também porque o pai de minha mãe, de quem recebi o nome, morreu muito cedo. Ao menos, para mim.

sábado, 28 de maio de 2011

O pai segundo o filho

Este sou eu na visão do João:



É, esse dedo em riste e essa cara amarrada valem um dia inteiro de reflexões...
Mas não há dúvidas de que tenho sido austero demais com os meninos.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Dia Nacional contra a covardia

Já tentei aqui esclarecer as razões pelas quais sou radicalmente contra bater em crianças. Escrevi o texto Bati no meu filho...  defendendo a aprovação do Projeto de Lei 7.672/2010 (ainda em tramitação na Câmara) que pretende proibir o uso de “castigos corporais ou de tratamento cruel ou degradante”.

Na época fui interpelado por algumas mães responsáveis e, tenho certeza, carinhosas com seus filhos. No fundo, ao afirmarem que “às vezes é necessário bater” revelavam já a insegurança quanto a utilidade dos tapinhas. Bem no fundo, todo pai e mãe, minimamente consciente, sabem que só bate em criança quem perde o controle.

Mas é difícil admitir. É duro constatar tamanha covardia. Por isso, respondia a essas mães, como consolo, que a proibição procurava alcançar casos muito mais graves. Por exemplo: maus-tratos em abrigos, espancamentos dentro de casa, castigos nas escolas, etc. Citava até o assassinato da Isabela Nardoni.

Provavelmente diminuía a força dos meus próprios argumentos recorrendo a esses exemplos extremados.

Infelizmente, hoje assisti num telejornal um “pai” espancando dois de seus filhos. As imagens, fortes, dizem tudo: http://www.youtube.com/watch?v=bFsUgBmYHmM


O Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes foi instituído pela Lei Federal 9.970/00. A data marca o crime bárbaro que chocou o país em 18 de maio de 1973, em Vitória/ES, e ficou conhecido como o “Caso Araceli”. Esse era o nome de uma menina de apenas oito anos de idade que foi raptada, drogada, estuprada, morta e carbonizada por jovens de classe média alta. Esse crime, apesar de sua natureza hedionda, até hoje está impune. A intenção do 18 de maio é destacar a data para mobilizar e convocar toda a sociedade.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Complexo de castração às avessas (nem Freud explica)

Sábado passado, eu e meu sogro conversávamos sobre a redução significativa do tamanho da família brasileira. Ele havia lido uma matéria no Estadão que repercutia os dados do novo Censo.

Hoje, li na Folha uma reportagem interessante sobre as "não-mães", mulheres que decidem não ter filhos. São variadas as razões pelas quais mais e mais mulheres tomam essa decisão, como registra a matéria abaixo.

Elas não querem filhos
Cada vez mais mulheres decidem não ter filhos. E não há Dia das Mães nem pressão familiar que as façam mudar de ideia.
Nos últimos 50 anos, a média de filhos por mulher no Brasil caiu de 6,1 para 1,9. Muitas só diminuíram o número de herdeiros, mas uma grande parte decidiu voluntariamente ficar para tia.
Segundo o demógrafo José Eustáquio Alves, pesquisador da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, sempre houve uma porcentagem de mulheres sem filhos.
Eram as chamadas solteironas ou aquelas que tinham problemas para engravidar, em torno de 10% da população. "Hoje, estima-se que 14% não são mães."
Esse crescimento aconteceu na última década, motivado por razões que vão muito além da popularização da pílula anticoncepcional.
As antropólogas Paula Pinto e Silva e Maíra Bühler, da consultoria Pletora, pesquisaram esses motivos entre 120 mulheres de 25 a 35 anos.
De acordo com elas, a maternidade deixou de ser vista como uma obrigação. Passou a ser uma escolha.
"Tinha-se a ideia de que ser mãe era uma função biológica, um dever. Isso não deixava outra opção. Agora, as mulheres sabem que podem ter outros papeis sociais."
Elas querem estudar, trabalhar, viajar, casar, ser tia ou madrasta. E muitas pensam que um filho pode atrapalhar os planos.
A ilustradora Ila Roberta de Oliveira, 29, nunca quis engravidar, muito menos agora que está juntando dinheiro para comprar um apartamento. "Uma criança atrapalharia a minha rotina."
Ila está casada há dois anos e, apesar de ainda ser jovem, não acha que vai mudar de ideia.
"As pessoas sempre perguntam: quando vem o bebê? Ninguém quer saber como vai a carreira", conta, sem assustar-se com a pressão.
"Gosto de crianças, mas, com o mundo do jeito que está, é difícil pensar nisso. Acho que fiquei tão responsável que não quero ser mãe."

Quem tiver interesse em conhecer o restante da matéria e, consequentemente, outras histórias e relatos basta acessar http://www1.folha.uol.com.br/fsp/equilibrio/eq1005201107.htm. Mas, para mim, esse trecho do texto já é suficiente para refletir sobre, digamos, essa recusa consciente da maternidade.

O mais curisoso é que a justificativa mais comum "filhos versus carreira profissional" foi inventada, não faz muito tempo, pelos homens modernos como forma de fugir da paternidade (e, por tabela, do casamento). Embora só os homens consigam continuar fugindo da paternidade recorrendo a essa desculpa "profissional" mesmo depois de ter filhos, acho estranho que cada vez mais mulheres renunciem a experiência da gravidez para ganhar mais dinheiro ou mesmo reconhecimento (que é melhor e mais digno do que o vil metal).

Como acredito que a felicidade decorrente do mais absoluto sucesso profissional não chega nem aos pés da felicidade que conquistamos pelo simples fato de Ser pai e mãe, fico sempre desconfiado dessas justificativas. No fundo, fico com a sensação de que essa tal recusa em ter filhos quando não revela a imaturidade do homem ou da mulher que a ostenta, tenta esconder um medo gigantesco de viver.

Ainda que pareça ofensivo, não consigo deixar de ter pena dessas mulheres. E talvez um pouco de inveja, porque sou desta geração de pais que, não sendo gay, daria o próprio pinto para levar no ventre o próprio filho.

Pena que essa, Freud não pode explicar.

sábado, 7 de maio de 2011

A mãe dos meus filhos

Emiliane ou Miroca Pipoca. A mãe dos meus filhos é, felizmente, a mulher que eu amo e mais admiro!

Aranha de estimação

Vire e mexe o João Pedro aparece em casa com insetos. Quase sempre, besouros; sobretudo, besouros verdes. Temos um aquariozinho onde eles ficam hospedados por uns dias até que consigamos convencê-lo de devolver os besouros ao jardim do prédio.

Mas é a primeira vez que temos uma aranha de estimação. Já faz mais de um mês que uma aranha bem diferente está morando no pau brasil do Antônio.
No começo ele ficou meio assustado. Afinal, é uma aranha bem diferente (lembra um filhote de caranguejo), meio assustadora , vivendo bem próxima de seu umbigo (ele ainda acha que o pedaço do cordão umbilical que plantei junto com a árvore ainda está lá).

Agora a gente já se acostumou com ela. Mas tive de dizer a eles (ao João também) que a aranha iria proteger a árvore de "insetos bandidos", isto é, de pragas. E, por isso, todo domingo caçamos uns mosquitos e os jogamos na teia ainda vivos para ver a "nossa" aranha enrolá-los, "igual a Laracna fez com o Frodo" (uma das cenas do filme O Senhor dos Anéis - O retorno do Rei), diz o Antônio.

E eu que nunca gostei de aranha... O que a gente não faz pelos filhos, hein?
Olhando bem, até que ela é simpática, não é?

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Mandamento Zero

Como o zero vem antes do número um, então, são onze, e não dez mandamentos.
Mesmo considerando que Moisés tenha inventado aquela história toda no Monte Sinai, o que não vem ao caso.

O que importa mesmo é que, há uns instantes, o Antônio me dava boa noite ao telefone dizendo "eu te amo papai". E não poderia deixar de reponder a ele dizendo: "eu te amo mais do que tudo, meu filho".
De pronto, ele redarguiu: "Você me ama mais do que Jesus?".

Fiquei tentado (será o capeta?) a lhe dizer tudo o que penso sobre as religiões em geral. Talvez ele pudesse me entender. Mas, felizmente, me contive a tempo e acabei lhe respondendo apenas que o amava acima de todas as coisas. Primeiro ele e o João, só depois Jesus.
Até me deu vontade de tatuar nos braços, como aqueles lutadores de vale-tudo, este meu mandamento zero: Amar aos filhos sobre todas as coisas.
Bem no fundo, é a única verdade em que acredito piamente.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Criando moleques

Criar moleques é bem diferentes de criar meninos.
Moleque não se cria confinado em apartamento ou mesmo dentro de casa, pois, moleque é que nem bicho solto, precisa de espaço.
Moleque se cria descalço para que possa pisar com firmeza e chutar com força bola, pedra e bunda de outros moleques.
Moleque, eventualmente, quebra o braço, corta a boca, rasga a cabeça, mas sempre tem os dedos e os joelhos ralados.
Moleque sabe subir em jaboticabeira, sabe nadar como peixe, sabe andar de bicicleta sem rodinha e sabe se defender.
Moleque é como o Jesus Cristo daquele poema extasiante de Alberto Caeiro (Fernando Pessoa), O Guardador de Rebanhos:
[...] 
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas pelas estradas
Que vão em ranchos pela estradas
com as bilhas às cabeças.
E levanta-lhes as saias.

Tudo isso tentei dizer sobre meus filhos à Coordenadora Pedagógica de uma escola em Brasília. Ela me pediu que falasse um pouco do Antônio e do João Pedro. Podia ter contado muitas coisas especiais a respeito desses dois moleques absolutamente normais. No entanto, preferi dizer apenas que haviámos (pai e mãe) decidido criá-los como moleques, isto é, como crianças de verdade vivendo uma infância verdadeira.

Pela expressões de seu rosto -- em reação a cada exemplo que eu dava -- parece-me que ela entendeu o que "criar moleques" significa para nós. Talvez ela só não tenha entendido a parte de subir em jaboticabeira, provavelmente porque nunca tenha subido. Talvez ela os tenha imaginado com ramelas nos olhos, nariz escorrendo, unhas pretas, solas encardidas e meio fedidinhos. Talvez não sejam assim, sujinhos como moleques, por causa dos cuidados e dos exemplos da mãe: nunca reclamaram para escovar os dentes e muito menos para tomar banho; pelo contrário, a gente tem que ficar de olho para que eles não usem todos os cosméticos da prateleira.

Bom, no fundo, acho mesmo que a razão de ter retratado os nossos filhos como molequinhos de primeira é uma só: queria ostentar o meu orgulho em ver tanto o Antônio quanto o João Pedro montarem em suas respectivas bicicletas sem rodinhas e sairam pedalando, firmes e fortes.



PS: Meu primo-irmão, Fernando, me disse que o equilíbrio de ambos é culpa do patinete. Desconfio que ele tem toda razão. Na dúvida, fica a dica: patinete na criançada!

segunda-feira, 18 de abril de 2011

O filho do Antônio

Domingo passado, Antônio e eu assistíamos juntos um programa que não tinha nada a ver com pai e filho, muito menos com pais e filhos que só podem ser ver nos finais de semana.
E, mesmo assim, do nada, sem que houvesse qualquer justificativa aparente, ele se virou para mim e me disse olhando nos olhos: "Pai, eu fico triste quando você vai embora".
Senti que a conversa era séria e que não poderia tergiversar. Por isso, respondi no mesmo tom, falei para o coração do Antônio que também ficava triste por ter que passar a semana toda longe dele, de seu irmão e de sua mãe. Disse ainda que quase morria de saudades.

Ele então me encarou por alguns segundos, suspirou fundo e desabafou: "Quando eu for adulto e trabalhar, não vou ficar longe do meu filho. Nem um dia!"

Abracei meu menininho com uma vontade tremenda de ser eu o filho do meu filho.



PS: Tirei as rodinhas da bicicleta do Antônio para que ele começasse a tentar e, de repende, já na primeira tentativa, não é que esse molequinho de 4 anos sai pedalando feito menino de 7. Consequencia: o João está se sentindo pressionado e, por isso, está um pouco receoso de tentar.

sábado, 2 de abril de 2011

Entrando pra turma da Mônica, do Chico e, quem sabe, do Lula

O João Pedro começou a "ler" os gibis da Turma da Mônica. Digo "ler", porque ele ainda não foi alfabetizado. Acho que ele acompanha a sequencia dos quadrinhos, interpreta as ações e se delicia com as estorinhas. "Lê" com uma voracidade supreendente.
A televisão agora é a sua terceira opção. Quando não quer brincar, ele prefere seus gibis.
É cada vez mais comum vê-lo acordar e se dirigir para o sofá da saleta com uma pilha de gibis nos braços.

Agora há pouco ele fez questão de organizar quase todos os seus gibis sobre a mesa da sala para exibí-los, como um tesouro, ao seu amiguinho. Aí me pediu que tirasse estas fotos e as colocasse na Internet, isto é, neste blog.


Comigo aconteceu do mesmo jeito: entrei para a turma da Mônica antes de apreender a ler. E lembro-me que adorava ir na casa do Binho, filho da Tia Cleo e do Tio João, para poder "ler" o montão de gibis que tinha. Ficava absorto por várias horas.
Com os anos fui criando o meu próprio acervo e lá pelos quinze anos já possuía uma coleção de fazer inveja. Até no Guarujá, onde passávamos as férias de verão, havia descoberto uma banca que vendia gibis usados, sem saber adquiri alguns "clássicos" da turminha, como a estorinha em que o Chico conversa longamente com um pingo de chuva.

E foi o Chico Bento quem me lançou na política. Na verdade, foi pelo Chico Bento que me lancei na política. A campanha pela eleição do Lula em 1989 me arrebataria definitivamente, mas debutei mesmo uns anos antes. Não me lembro ao certo (e não consegui identificar precisamente) quando teve início no Brasil um debate sobre os malefício que a fala errada do Chico causava às crianças em processo incial de alfabetização. Era o início dos anos 80 e, eu que já era um leitor contumaz da Turma, resolvi escrever uma cartinha em defesa do caipirês do Chico Bento. Foi minha primeira manifestação politica, justamente contra a censura. Felizmente, ganhamos a parada e, por isso, hoje o João e o Chico (e logo mais o Antônio) são grandes amigos.

domingo, 27 de março de 2011

A terceirização do amor (parte 2, final)

Resumindo o que foi dito antes: me parece bom para a criança que seus pais compartilhem sua educação com outros adultos responsáveis e capazes de oferecer boas referências e ótimos exemplos. Melhor ainda se esses “outros adultos” forem capazes de amar essa criança. Mas quando os pais admitem sua inaptidão para a maternidade e para a paternidade assumindo que não querem perder tempo com “pessoas em desenvolvimento” (que precisam aprender a comer, a se limpar, a ler, etc.) a melhor escolha é terceirizar a educação dos filhos, entregá-los a terceiros relativamente competentes para tanto.

Juro que não acho o cúmulo da irresponsabilidade esses “pais” que não conseguem se interessar pela infância de seus filhos. Acho que não preciso relembrar que faz menos de cem anos que as crianças viraram gente, antes disso eram consideradas na melhor das hipóteses um “projeto de gente” que podia ou não vingar. E para aumentar as chances desses “projetos” resultarem em adultos educados é que, justamente, foram criados, por exemplo, os colégios internos, para onde era enviada a filharada de modo que seus pais pudessem afastar as preocupações cotidianas que uma criança por perto inevitavelmente carreia. Ainda há colégios internos na Suíça e mesmo no Brasil, porém, já não gozam da mesma aceitação entre os ricos porque acabam evidenciando que os pais querem se ver livres e longes de seus filhos.

Uma pena porque, insisto, a melhor coisas que esses “pais” desinteressados podem fazer para seus filhos é oferecer a eles pessoas que se interessem verdadeiramente por eles. Pessoas que gozem da admiração e do reconhecimento desses “pais”, como avós, preceptores, tias, entre outros. Talvez um dia essa criança abandonada seja capaz de compreender que seus “pais” incompetentes ao menos tentaram honestamente lhe fazer um bem ao delegar sua educação a terceiros confiáveis e dignos da missão de ser pai e mãe (ainda que na terapia ela diga que teria preferido, se pudesse escolher, viver a indiferença de seus pais; certamente, com expectativa inocente de que seu amor e sua presença pudessem sensibilizá-los).

Muito pior fazem aqueles “pais” (também entre aspas) que não tendo a coragem de admitir sua incapacidade de amar seus próprios filhos resolvem fingir, por status ou porque está na moda, que dão conta do recado. E às vezes fingem tão completamente que acabam acreditando na ilusão que administram com ares de grande empresário. Fazem mal para a criança porque enquanto tentam dissimular a terceirização de seus filhos, ou melhor, o desinteresse pela infância, reproduzem toda sorte de preconceitos que desqualificam a atuação desses terceirizados.

Olha só se tem cabimento a conversa das madames ali no shopping de Rio Preto: “Pelo menos duas vezes por dia eu fiscalizo a troca de fraldas do meu bebê; e para verificar se a babá da noite (tenho três, uma a cada oito horas) faz tudo direitinho eu instalei uma câmera com infra-vermelho em doze pontos do quartinho”.

E aí esses “pais” que não compartilham a educação de seus filhos porque a empregada é “preta”, é “pobre” e “é burra” acabam dando um nó na cabeça das crianças: pois como é que minha mãe e meu pai podem me deixar com uma pessoa em quem não confiam e tampouco atribuem qualquer valor? Este é o paradoxo de que falava no final da parte 1, postada dias atrás.

É claro que uma criança de sete anos não vai formular a questão tal como escrevi acima, mas não há dúvida de que ela vai sentir profundamente a contradição: “Por que meus pais tratam mal e vivem desconfiando da empregada que eles mesmos arrumaram para cuidar de mim?”.

É assim. Não tem jeito. É caminho sem volta. Se nos tornamos pais e mães — por desejo, por sorte ou por azar — só há duas coisas a fazer: tomar o rebento nos braços e fazer de tudo para que ele seja amado e feliz (inclusive, beber menos, trocar fralda, contar estórias, ler mais, reaprender a brincar, enfim, “perder tempo e dinheiro” com seus filhos) ou então passar a bola e deixar que outros, a quem atribuímos as qualidades que não dispomos, o façam. O que não vale é posar dissimuladamente como mãe ou como pai apenas porque posso pagar um batalhão de terceirizados comandados pelo poder de meus preconceitos.



Ponto final. Não vou nem falar mais da Fräulein.

sábado, 26 de março de 2011

Salve São José, padroeiro da paternidade (e deste blog)


Está fazendo uma semana que São José (19 de março) fez “aniversário” e eu ainda não consegui prestar, isto é, postar minha homenagem ao santo de minha devoção.
E, a partir de hoje, será também o santo padroeiro deste Filhosofias (seguido por Xangô e por São Jorge de Ogum).

Não sei ao certo se poderia dizer que tenho fé em São José. Em meu sincretismo ateu acho que já não existe mais essa palavra, pelo menos não com um sentido divino: porque só consigo ter fé naquilo que nós, os seres humanos, somos capazes de produzir de bom; como por exemplo, a idéia de que existe um Deus que nos livra dos males e faz da morte apenas uma indispensável condição para a vida eterna.

Mas sem dúvida alguma sou fã desse cara. Considerando tudo o que dele dizem os evangelhos (incluindo os apócrifos), José foi um baita de um Pai pra Jesus. Fico inquieto só de pensar no que ele teve de fazer na noite do nascimento de Jesus numa gruta no meio da nada para poder dar comida à sua mulher e ao recém-nascido e ainda por cima manter os animais com seus piolhos e carrapatos relativamente afastados. Além do mais, embora ninguém fale sobre o parto (nem o Leonardo Boff no livro que me serve de referência São José, a personificação do Pai), tenho certeza que foi São José quem amparou Maria e quem cortou o cordão. Se você é um carpinteiro ou um advogado e teve a honra de fazer o parto de seu próprio filho sabe o quanto é difícil lidar com todo aquele sangue, com o cheiro de entranhas, com a placenta... enfim, salve São José.

Esta imagem, que estampa a contracapa do mencionado livro de Leonardo Boff e que é uma pintura da Igreja de Saint François du Lac no Quebec, diz tudo sobre São José e sua relação com o menino-deus. Porque nela Jesus dorme serenamente enquanto é carregado por seu pai numa demonstração evidente de que tem segurança e amor.


“Segurança e amor” trata-se duma síntese bastante apertada, mas muito adequada ao que nós, os pais, deveríamos representar para os nossos filhos.

Acho que é por isso que trago sempre comigo uma pequena imagem em madeira de São José. Levo para todo lugar que eu vou, não como um amuleto mágico capaz de evitar que o avião caia ou que receba elogios ao fim de cada trabalho (tem muito católico que adora transformar o seus santinhos em verdadeiros muiraquitãs, como os índios do baixo-amazonas). São José vai comigo para me lembrar de duas coisas muito importantes: a primeira é que eu fui amado por meus pais (que me deram a estatueta) tanto quanto José amou a Jesus e a segunda é que devo amar a meus filhos tal como fui amado e como José ensinou.

E para finalizar esta minha louvação, a música postada abaixo se chama José. Já foi cantada pela Rita Lee, mas para mim encontrou a sua mais perfeita expressão na interpretação do Grupo Galpão, quando da encenação da peça de teatro “A Rua da Amargura”. E, é claro, foi essa música que tocou quando eu entrei de braço dado com minha mãe para me casar com minha Mi. E como não poderia deixar de ser o Antônio e o João Pedro gostam muito dela.

segunda-feira, 14 de março de 2011

A terceirização do amor (parte 1)

Decidi abordar a denominada “terceirização dos filhos” ― expressão usualmente utilizada para designar a prática de deixar a educação de nossas crias sob a responsabilidade de terceiros ― dias antes de publicar aquela postagem sobre “A babá dos meninos”. Pensei em escrever a respeito, logo depois de “brigar” com a Emiliane por causa de umas colheradas de chocolate em pasta que ela serviu ao Antônio de café da manhã (embora ela diga que comer Nutella de colher não é o mesmo que comer chocolate). Fiquei pê da vida por ela ter dado o doce apenas porque ele pediu. Aí falei: “Poxa, as vezes você se comporta como se fosse Tia dos meninos, e não mãe. Assim fica fácil, dando tudo o que eles pedem. Mas isso não é educar, não é o nosso papel. E se não somos capazes de ajudá-los a crescer, o melhor a fazer é permitir que outras pessoas o façam. Enfim, melhor deixar que a Tata dê café para os meninos”. Falei, na hora, com a intenção de ofender, por isso me desculpei mais tarde e namoramos às pazes.

Contudo, acho que queria mesmo era tratar dos nossos limites ― como a falta de tempo, por exemplo ― como pais e como pessoas. Pois, no fundo, por mais que nos esforcemos, certamente não teremos competência para oferecer aos nossos filhos todas as referências e todas as orientações de que necessitam para se desenvolverem adequadamente. E mesmo que tenhamos (ou que acreditemos ter) creio que é recomendável partilhar a educação dos nossos filhos com outros adultos responsáveis, da babá aos avós, passando necessariamente pelos professores.

Há bastante tempo venho refletindo sobre isso. E espero que consiga enfrentar o tema sem ironias (é um vício) e sem rodeios. Mas vou fazer duas digressões (e, provavelmente, uma ironia), a la Almeida Garret.

É que, antes, preciso contar duas coisas: primeiro sobre as amas-de-leite dos séculos passados e depois sobre a Fräulein, a “babá” prostituta do livro Amar verbo intransitivo de Mário de Andrade.

Não sei se todo mundo sabe que no século XIX prevalecia o costume entre “os ricos e/ou bem-nascidos” de não amamentar os próprios filhos. Tanto no Brasil quanto na Europa.

As razões eram praticamente as mesmas: por um lado, entendia-se que a criança não era tão relevante assim para ocupar tanto tempo da mãe (em detrimento dos demais filhos e, principalmente, do pai); e, por outro, não se recomendava às mulheres de alta classe que constantemente desnudassem suas tetas para serem sugadas, mesmo em ambiente reservado (até porque a sucção faz cair o peito ainda que ninguém observe o ato).

Daí a presença cativa das amas-secas, responsáveis pela amamentação dos recém-nascidos, nas famílias relativamente abonadas. Essa época esta retratada nesta foto, tirada por Augusto Gomes Leal, da ama-de-leite Mônica (extraído do texto “As amas no estúdio do fotógrafo” disponível em http://www.studium.iar.unicamp.br/africanidades/koutsoukos/2.html) certamente adornada com as jóias da mãe do garoto.

Esse mesmo retrato consta da capa do livro História da vida privada no Brasil 2 - Império: a corte e a modernidade nacional de Luiz Felipe de Alencastro (org.). Por sua vez, esse livro explica que pelos idos de 1850 começa a surgir na Europa um movimento pela amamentação maternal: “há toda uma discussão sobre as vantagens do aleitamento materno, a fim de garantir melhores cuidados ao bebê e, supostamente, transmitir-lhe, pelo leite, as qualidades culturais de sua mãe.”

No Brasil, impulsionado pelo preconceito racial, o movimento pelo aleitamento ganha ares de campanha a ponto de um jornal paulistano “esclarecer”, em 1853, (estou citando o livro História da vida...) o seguinte: “O infante alimentado com o leite mercenário de uma africana, vai, no desenvolvimento de sua primeira vida, aprendendo e imitando seus costumes e hábitos, e ei-lo já quase na puberdade qual outros habitantes da África central, sua linguagem toda viciada, e uma terminologia a mais esquisita, servindo de linguagem”. Os exemplos são: caçula, cabaço, cafuné, pererê, fuzuê, etc.

E assim, acreditem ou não, foi a discriminação racial que motivou o aleitamento materno entre as mulheres brancas e, via de regra, ricas. Apesar da leve deformação no seio, a mãe podia transmitir a seu filho toda sorte de preconceitos com seu leite. Hoje em dia, as mulheres modernas contam com estímulos muito mais interessantes, como a prótese de silicone.

No entanto, embora as amas-de-leite tenham sido aniquiladas pelo preconceito racial, vigora e prevalece no Brasil uma discriminação mais complexa dirigida às empregadas domésticas e às babás, para as quais atribuímos paradoxalmente a proteção e a educação de nossos filhos.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Classificação indica-ativa - "Garoto Cósmico de Alê Ribeiro"

Taí uma animação brasileira de primeira. É o João Pedro quem atesta.

Nós, os adultos, gostamos um pouco mais porque tem Raul Cortez, Arnaldo Antunes, Vanessa da Mata, Belchior, Wellington Nogueira e, como se diz no circo, grande elenco.
Pena que ainda não é fácil encontrá-lo nas locadoras. Mas vale a pena procurá-lo e, quando não o encontrar, peça ao dono do estabelecimento que compre o filme para a felicidade geral da criançada.

Em resumo, a estória é assim: Cósmico, Luna e Maninho são crianças de um mundo futurista, onde as vidas são totalmente programadas. Certa noite, buscando mais pontos para obterem um bônus na escola, os três perdem-se no espaço e descobrem um universo infinito, esquecido num pequeno circo. Depois de muita brincadeira e tantas novas experiências, o mundo da programação envia um representante especial para resgatá-los. É hora de escolherem seus próprios caminhos (http://www.filmedepapel.com.br/pagina.php?id=77).




Já assisti uma dezena de vezes e continuo intrigado com a seguinte questão: Aonde estão os pais dessas crianças?

Que mundo é este em que as crianças são criadas por máquinas e de acordo com uma programação impecável? Será que este é o futuro da terceirização dos nossos filhos?

Tchan, tchan, tachn, tchan... (a seguir cenas do próximo capítulo)

quinta-feira, 10 de março de 2011

A babá dos meninos

É muito provável que, em breve, nos mudemos para Brasília. De volta à cidade em que os meninos nasceram. E crescerão, se tudo der certo, pelos próximos quatro anos.

Aos poucos, eu e a Mi, vamos tentando convencê-los (e nos convencer) de que a vida lá em Brasília pode ser tão feliz quanto tem sido para todos nós aqui em Catanduva. Apesar da distância dos avós, dos tios, das pessoas bem-próximas, dos amiguinhos, dos bichos da chácara, enfim, de quase todos os que nos amam e amamos enormemente [diante dessa relação de afetos e de apreços não há convencimento que prevaleça].

Ainda bem que estamos tendo um tempo para que as primeiras emoções (de perda, sobretudo) se assentem e os sentimentos duradouros possam se estabelecer.

Para o Antônio e seus 4 anos tudo já parece estar resolvido. Foi só lhe dizer claramente que dessa vez todos voltaríamos juntos, isto é, que o papai não se mudaria sozinho. Não que ele não vá sentir falta dos avós e das pessoas que o amam, mas para ele o mundo ainda se completa apenas com o papai Du, mamãe Mi e o Dedé.

Já o João é outra história. Vejam só. Dia desses, a babá dos meninos nos contou que ele pediu a ela que o adotasse para que ele continuasse morando em Catanduva. Ele foi rápido demais, pois a Tata, que é como os meninos apelidaram a Alaídes, acabara de se casar e o João, certamente considerando esse fato, logo concluiu que ela e o marido iam “precisar” de um filho. “Eureka!”, deve ter pensado (com outras palavras).

Por incrível que pareça eu fiquei super feliz. Primeiro, é óbvio, por saber que o João já é capaz de elaborar um raciocínio tão complexo. E depois fiquei feliz pela Alaídes, pelo reconhecimento que ela obteve na avaliação dos meninos, que é o mais importante. Sim, foi também uma manifestação de apego aos nossos familiares e de satisfação em relação à vida que levamos por aqui, porém o pedido do João Pedro foi essencialmente uma declaração de amor à sua babá.

E se o Antônio tivesse os 7 anos do João certamente diria o mesmo. Porque a Tatá realmente merece. A Alaídes fez por merecer o amor e o carinho dos meninos.

Sua responsabilidade é admirável. Sua disposição em aprender e fazer sempre melhor é surpreendente. São vários os exemplos que me parecem digno de nota. Registro apenas o mais recente: Tive de viajar com a Emiliane às pressas para Brasília de um dia para outro. Por alguma razão, que não me lembro, não deu para deixar os meninos com os avós ou com um dos os tios. Pedimos então à Tata que chegasse em casa até às 6 horas da manhã do dia seguinte para que não perdêssemos o vôo que partia às 7:15h de Rio Preto. Mesmo confiando em sua responsabilidade, resolvi deixar minha mãe de sobreaviso para qualquer eventualidade. Contudo, às 5:45h a Tata já estava nos esperando no sofá.

E pensar que ela não tem nem 20 anos.




Pois é por causa dessa “menina” que hoje chego a reconsiderar minha oposição veemente à terceirização dos filhos. Há casos em que uma babá excelente pode (e deve) realmente substituir, total ou parcialmente, pais e mães que têm muito dinheiro e nenhuma educação.

Aliás, por oportuno, vou tocar nesse assunto na próxima postagem.

quarta-feira, 9 de março de 2011

O Antônio e o antônimo da felicidade

Ontem apareceu um arco-íris no céu diante de nossa sacada. Chamei os meninos pra ver.
E ali com eles, olhando pro horizonte, disse que minha felicidade naquele momento ia do meu coração até ao pote de ouro (que eles sabem que está no fim do arco íris). Uma felicidade imensa.

Então, o Antônio me olhou bem e perguntou: "Você não está mais triste comigo?"

"Não, filho. Eu estou feliz com você e com o João, porque estamos nós três aqui". E emendei: "Mas, por que estaria?".

Ele devolveu: "Porque eu cuspi achocolatado na privada".

Demorei uns segundos para entender. Ou melhor, para me lembrar que há DOIS meses, num domingo, deixei o Antônio de castigo em casa porque ele tinha cuspido o achocolatodo por todo o vaso do banheiro por pura safadeza, apenas eu eo João fomos ao teatro no SESC.

"Caramba!", pensei com meus botões, "Certamente falei que fiquei triste com o que ele fez. E será que até hoje ele está pensando que estou triste?".

Pois é, taí um belo exemplo de que devemos tomar muito cuidado com o que dizemos para as crianças. Porque fica, as palavras marcam, as vezes para sempre.

Por outro lado, o exemplo serve para demonstrar que o Antônio já sabe qual é o antônimo da felicidade. Consolo de pai é pinico.

terça-feira, 8 de março de 2011

Manhã de Carnaval

Nesta terça, antes de ir a Bauru para o enterro de meu tio, brinquei com os meninos de playmobil.
Tentando explicar os motivos da viagem inesperada disse ao João e ao Antônio que o irmão de meu pai era avô de um menino chamado Rafael que tinha sete anos e que iria adorar brincar com eles. Principalmente de playmobil, porque o pai dele -- que se chama João Vicente -- quando era criança e vinha passar as férias comigo em Catanduva -- que sou seu primo --  gostava muito de brincar de playmobil. E esse gosto (de brincar de playmobil) os pais sempre passam para os filhos.

Aí o João Pedro me pediu, daquele jeito especial dele, que tirasse uma foto da nossa brincadeira e colocasse no nosso site Filhosofias para que o Rafael pudesse ver como os playmobis resistiram corajosamente ao ataque dos animais-robôs.

Embora não tenha conseguido transmitir ao meu primo, que não via há mais de três anos, a "mensagem" do João Pedro, fica aqui o registro de seu desejo.






Geração esperança

Em 2003, no ano em que o João Pedro nasceu, muitos amigos nossos também tiveram filhos ou ficaram grávidos.

Já naquela época costumava associar esse "babyboom" em nossa turma como o renascimento da esperança que, para a maioria dos brasileiros, havia ocorrido com a eleição de Lula Presidente.

Para quem não tem muito interesse por política, mas nutre uma certa rejeição preconceituosa pelo Lula (e pelo PT), provavelmente não vai compreender e muito menos aceitar a relação que há anos estabeleci entre sua eleição, o despertar da esperança e a chegada do João e outros tantos novos companheiros.



E no entanto para o nosso círculo de amigos, para a nossa turma, foi mais ou menos assim que tudo aconteceu: primeiro fomos fecundados pela esperança de um país melhor e mais justo, principalmente para os mais pobres, e depois fomos namorar para produzir os moleques e as meninas. Dizia, como minha poesia panfletária, "lá fomos nós semear a esperança" (como esta dente-de-leão aí da foto que é o símbolo do blog). Por isso, acabei batizando as crianças que nasceram ou foram concebidas no período 2002-2003 de "Geração esperança". 

Pelo menos no meu caso -- que levei um susto danado com a gravidez -- o slogan da vitória "A esperança venceu o medo" faz todo sentido.

Mas só toquei nesse assunto de "esperança" para poder abordar um outro tema. O avesso desse. E, portanto, triste.

Acontece que bastou eu lembrar daqueles anos de euforia e alegria para que perdesse por completo a vontade de falar de outra coisa.

Pensando bem, se eu parar por aqui até dá tempo de pular carnaval com a Mi e os meninos... E cantar com toda força: "Tristeza, por favor vá embora. Minha alma que chora..."

quinta-feira, 3 de março de 2011

Entrevista - Animação: entre o interesse da infância e o da indústria

Quem se interessa por animação, midia de qualidade, comunicação adequada a crianças, etc., talvez se interesse pela entrevista que dei a Marcus Tavares, um jornalista especializado no assunto que tem empregado seu talento para que as crianças recebam atenção prioritária. Para conferir: Animação: entre o interesse da infância e o da indústria

quarta-feira, 2 de março de 2011

Até parece maldade de pai, mas não é

Posso garantir que não é maldade, porque o pai que praticou o "ato" sou eu.

Brincávamos (até agora há pouco) com um bando de Max Steel, que são os filhos do boneco Falcon dos anos 80. "Brincávamos" uma vírgula, na verdade só o João Pedro brincava e se divertia, pois todas as vezes que eu o Antônio colocávamos um boneco de pé lá vinha o João derrubá-lo sob o argumento de que "na guerra vale tudo".
Pedimos que ele parasse umas dez vezes. Sem sucesso. Aí quando o Antônio se levantou pra resolver no braço, reassumi meu posto de comandante supremo e ordenei: "Se você quiser continuar conosco aqui na sala não se atreva a derrubar nem mais um boneco, do contrário vou te colocar pra dormir já".
Ficou na dele uns dois minutos. E então começou a (a)tacar seu boneco preferido contra os objetos da sala.
Entrei em cena novamente como o-pai-do-pedaço e disse: "Pare de fazer barulho e se eu tiver de chamar sua atenção mais uma vez - seja qual for o motivo - você vai pra cama. Entendido?".

Assim pudemos montar uma bela estória com dois Maxs Steel salvando um outro Max Steel das garras de um urso gigantesco enquanto outros dois Max Steel tentavam domar a fera, com o auxílio de um lobo de estimação. Os bonecos ficaram bonitos todos de pé e empenhados no resgate. E o João só de butuca.

Depois de um tempinho o Antônio se desinteressou pelos Max e foi bruncar de playmobil. Levantei-me para tomar banho e o João me perguntou se podia acabar com a estória. Entenda-se jogar o seu Max Steel predileto sobre os demais. Pensei um pouco e disse: "Vou pensar, mas primeiro guarda os que estão jogados".

Mal liguei o chuveiro e veio ele me dizer que já tinha guardado e se [portanto] podia destruir a cena. Respondi que sim, porém só quando eu voltasse pra sala. Justamente porque eu sei que o João é impaciente (como quase toda criança de 7 anos) resolvi fazê-lo esperar um pouco, no fundo, fazê-lo sofrer um poquitinho.

Essa é a maldade. Ou melhor, isso é o que parece maldade. Mas não é. Pelo contrário, é uma estratégia pedagógica para evitar que ele sofra com a ansiedade (que é um dos males que mais aflige a humanidade hoje em dia). O princípio é o mesmo da vacinação ou da imunologia: você injeta na criança um anticorpo enfraquecido (um sofrimentozinho) para que ela desenvolva antígenos fortes e não sofra com a doença.

Além do mais, li naquele livro do Neil Postnam (O desaparecimento da infância, que vivo citando aqui no Filhosofias) que aprender a retardar o gozo é um exercício indispensável de maturação intelectual e emocional.

Por fim, depois de uns 25 minutos (uma eternidade para o João) apareci na sala para autorizar e contemplar a matança.