terça-feira, 26 de abril de 2011

Criando moleques

Criar moleques é bem diferentes de criar meninos.
Moleque não se cria confinado em apartamento ou mesmo dentro de casa, pois, moleque é que nem bicho solto, precisa de espaço.
Moleque se cria descalço para que possa pisar com firmeza e chutar com força bola, pedra e bunda de outros moleques.
Moleque, eventualmente, quebra o braço, corta a boca, rasga a cabeça, mas sempre tem os dedos e os joelhos ralados.
Moleque sabe subir em jaboticabeira, sabe nadar como peixe, sabe andar de bicicleta sem rodinha e sabe se defender.
Moleque é como o Jesus Cristo daquele poema extasiante de Alberto Caeiro (Fernando Pessoa), O Guardador de Rebanhos:
[...] 
É uma criança bonita de riso e natural.
Limpa o nariz ao braço direito,
Chapinha nas poças de água,
Colhe as flores e gosta delas e esquece-as.
Atira pedras aos burros,
Rouba a fruta dos pomares
E foge a chorar e a gritar dos cães.
E, porque sabe que elas não gostam
E que toda a gente acha graça,
Corre atrás das raparigas pelas estradas
Que vão em ranchos pela estradas
com as bilhas às cabeças.
E levanta-lhes as saias.

Tudo isso tentei dizer sobre meus filhos à Coordenadora Pedagógica de uma escola em Brasília. Ela me pediu que falasse um pouco do Antônio e do João Pedro. Podia ter contado muitas coisas especiais a respeito desses dois moleques absolutamente normais. No entanto, preferi dizer apenas que haviámos (pai e mãe) decidido criá-los como moleques, isto é, como crianças de verdade vivendo uma infância verdadeira.

Pela expressões de seu rosto -- em reação a cada exemplo que eu dava -- parece-me que ela entendeu o que "criar moleques" significa para nós. Talvez ela só não tenha entendido a parte de subir em jaboticabeira, provavelmente porque nunca tenha subido. Talvez ela os tenha imaginado com ramelas nos olhos, nariz escorrendo, unhas pretas, solas encardidas e meio fedidinhos. Talvez não sejam assim, sujinhos como moleques, por causa dos cuidados e dos exemplos da mãe: nunca reclamaram para escovar os dentes e muito menos para tomar banho; pelo contrário, a gente tem que ficar de olho para que eles não usem todos os cosméticos da prateleira.

Bom, no fundo, acho mesmo que a razão de ter retratado os nossos filhos como molequinhos de primeira é uma só: queria ostentar o meu orgulho em ver tanto o Antônio quanto o João Pedro montarem em suas respectivas bicicletas sem rodinhas e sairam pedalando, firmes e fortes.



PS: Meu primo-irmão, Fernando, me disse que o equilíbrio de ambos é culpa do patinete. Desconfio que ele tem toda razão. Na dúvida, fica a dica: patinete na criançada!

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