sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Comentário n'o lado M de mamãe...


Era para ser um comentário no blog da Melina, o lado M de mamãe... , sobre o texto de ontem em que ela trata de agressões na escola. Mas como estou de férias e um pouquinho resfriado, fui escrevendo, escrevendo e virou esta nova postagem.

Em julho de 2008 registrei no Livro dos Meninos (meu quase diário de bordo) que presenciei a Emiliane esbravejando com o João Pedro — que na época tinha 4,5 anos — porque ele havia apanhado do Tutuzinho (a criança mais nova da sala dele, então com uns 2 anos e pouco) com um pedaço de pau. Vi o corpo dele todo marcado pelas pancadas e fiquei injuriado.
As pauladas extrapolavam em muito nossos limites, embora soubéssemos que o Tutuzinho batia com freqüência em todas as crianças mais velhas — estávamos acostumados com uma mordida, um arranhão, um tapa e outras “lesões corporais leves”. Afinal de contas, podiam ferir gravemente.
Mas, naquele momento, o problema para gente não era o Tutu bater: já vínhamos discutindo regularmente o “caso” nas reuniões de pais, mães e professoras (os pais do Tutuzinho eram super tranqüilos e excelentes pessoas) que aconteciam todo mês na Moara, nossa escola Waldorf de Brasília. O problema era que João Pedro não havia reagido como ensinamos: se afasta do perigo evitando a agressão e avisa a professora; pronto. Nunca diríamos para ele bater de volta (“olho por olho”), mas de modo algum queríamos que ele apanhasse.
E para piorar parecia que ele não estava dando a mínima para nossa conversa, pois enquanto falávamos João tentava se distrair. Então, quando ele nos deu as costas para ir brincar, eu perdi a paciência. E num salto o segurei firme pelo braço e lhe dirige em tom ameaçador a pergunta mais cretina de minha vida: “— Afinal, João Pedro, você gosta de apanhar?”
Na lata ele me respondeu: “— Gosto”.

Fiquei com cara de bunda e depois passei dias, inconsolável, pensando um bocado de besteiras do tipo “estou criando um maricas” ou “melhor trocar o Bambi pelo Rambo IV” ou “vai pro colégio militar amanhã” e por aí fui.

Demorou um tempinho até que eu pudesse me dar conta de que para o João Pedro a paulada do Tutuzinho não era uma violência. Logo eu que vivia defendendo a “perspectiva da criança” não havia me dado o trabalho de tentar compreender qual o significado do ato para o João. Equivocadamente, tentei forçá-lo a ver como eu via: risco iminente de morte.

Hoje tenho certeza que ele consegue distinguir suficientemente uma brincadeira perigosa de uma violência mesmo moderada. Não faz muito tempo, contei aqui, na postagem Entre tapas e beijos, como ele se safou da ameaça de um amiguinho.

Com o Enzo a coisa me parece um pouco diferente. Talvez mais fácil por um lado (dele) e mais difícil por outro (de menina e da escola).
Mais fácil porque se o Enzo te contou que levou uma mordida acho que ele queria saber se isso é certo ou se é errado para você, o que também significa que ele apreendeu os significados que sua família atribui a mordidas e a arranhões em geral (imagino que ele tenha ouvido, noutras ocasiões, que é errado). Isto é, você não precisa se preocupar em dizer a ele exatamente o que fazer porque ele (é o que me parece) já assimilou uma regra de conduta ainda mais complexa do que a autodefesa: o que é errado deve ser evitado ou então corrigido. Pode ficar tranqüila e orgulhosa com essa aquisição evolutiva.
O outro lado, mais difícil a meu ver, é aonde desconfio que está o perigo: a professora e/ou a escola não estão preparadas para fazer do fato “menininha que bate” uma oportunidade pedagógica para todos, sobretudo para os pais da criança. No fundo, a educação escolar ainda não sabe o que fazer com o conflito (da perspectiva do adulto). Aqui em Catanduva infelizmente não há uma única escola que tenha estruturas e rotinas capazes de transformar problemas eventuais em possibilidades de formação e transformação de professores, pais e alunos. Isso inclui o nosso Colegião. Quando me refiro a estruturas e rotinas estou pensando em coisas simples do tipo reuniões periódicas, encontros semanais e atividades conjuntas que nos permitam conversar, trocar idéias, resolver problemas e planejar conjuntamente o futuro dos nossos filhos. Ou não. Pode ser que numa dessas ocasiões a gente se dê conta que os pais dos coleguinhas de nossos filhos não valem uma conversa sobre o clima (“vai chover?”). Mas aí, pelo menos, a gente não hesita em chamar o Conselho Tutelar para dar conta do recado. Brincadeirinha.

Apesar de tudo, resta a esperança de que a mãe da menininha e a coordenadora pedagógica da escola do Enzo leiam o seu blog. Pensando bem, vou mandar um e-mail recomendando a leitura. Tudo bem?





PS: Em tempo, quando fui com a Mi “conhecer” a Coordenação do Infantil do Colegião perguntei diretamente como a escola lidava com conflitos e exemplifiquei com agressões entre crianças. Na Moara, em 2005, além de perguntar a mesma coisa também questionei o nível de inadimplência, pois queria saber se a existência de uma comunidade escolar (formada por pais, alunos e mestres) resultava na prática em pagamentos em dia, em respeito com os profissionais e com os demais pais.

Um comentário:

  1. Dú adorei o "comentário post", realmente é complicado lidar com essa situação já que ela é totalmente nova para mim. Me sinto orgulhosa por saber que Enzo não revidou, não foi agressivo e se preocupou em nos contar já que para ele isso não é normal porque se fosse com certeza passaria batido.
    A idéia sobre os grupos de discussão e a possibilidade de tratar os problemas juntamente com a escola e os pais é maravilhosa mas, não tenho grandes expectativas em relação a isso aqui em Catanduva também.
    O que me leva a pensar na quantidade de pais que simplesmente preferem passar para os educadores a responsabilidade de ensinar, uma tristeza.
    Bom...fica aí a minha vontade de fazer a diferença na educação do meu filho e vou esperar que as coisas melhorem, por enquanto, acompanhar de perto.
    Espero que vc já esteja melhor da gripe!
    Abraço

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