sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Uma saída honrosa (e eficaz) para birras

Tentei encontrar no “Caderno dos Meninos”, onde desde a primeira gravidez lanço apontamentos imediatos sobre o que vivencio com meus filhos, um registro de uma birra que o João Pedro deu num supermercado de Brasília nos idos de 2006 quando ele tinha em torno de três anos, um pouco mais do que o Enzo, filho da Melina.

É que eu queria oferecer os detalhes de como tudo se passou. Ou melhor, de como conseguimos — eu e o João — evitar um desfecho trágico. Mas infelizmente não encontrei (deve ter escrito numa folha em separado).

De qualquer forma o contexto é muito parecido com o da Melina, a única diferença da padaria para o supermercado é a quantidade de prateleiras porque o apelo ao consumo (no conjunto) é o mesmo.
Lembro-me que a Mi já estava grávida do Antônio e eu estava sempre ocupado demais com as coisas do trabalho. Naquele dia cheguei em casa ainda mais tarde, encontrei o João Pedro a mil por hora e a Mi exausta. Ele disse que queria comer bombom e eu achei que era um ótimo pretexto para aliviar a cansaço da mãe e a culpa do pai. Peguei o carro e lá fomos nós.

Até que nos divertimos bastante com o carrinho e com os peixes mortos. Tomei uma cerveja, ele um achocolatado, pegamos os bombons (os dele e os da mãe) e nos dirigimos para o caixa.

Entramos nessas filas de caixa rápido formadas por corredores de biscoitos, balinhas e supérfluos em geral (que costumamos chamar de “porcarias”, embora gostemos de comer). A intenção é uma só: coagir o cidadão a comprar o que não é necessário, o que está fora da lista, porque se fosse importante ele teria comprado antes. E o filho do cidadão, que não tem idade para entender a maldade, quase enlouquece. O pai, é claro.

Deve ter durado uns cinco minutos nossa espera, tempo suficiente para eu falar “não” umas 30 vezes (um “não” a cada 10 segundos são 6 por minutos multiplicados pelos 5 que passamos na fila). Mas dei sorte, porque nesse dia a maioria dos enfileirados era de pais que pareciam compreender a minha situação e que me ofereciam apoio a cada negativa.

No entanto, depois de passar as mercadorias pelo caixa e entregar o cartão para pagamento me dei conta que o João Pedro, sentado dentro do carrinho, tentava abrir uma caixinha dessas balas ardidas (tipo Tic-Tac). Zup! Arranquei a caixinha das mãos dele e disse “não”.

Pela reação descontrolada do João tenho certeza que alguém na fila deve ter pensado que eu havia arrancado um braço dele ou furado os olhos do menino. Acho que só não saí correndo e deixei meu moleque gritando e esperneando porque a moça estava com meu cartão de crédito.

Pedi para ele parar. Mas que nada, nem me ouviu.

Agi rápido, sem pedir outra vez e fazer ameaças: segurei firme o João pelos braços e o tirei do carrinho de supetão. Ele se assustou, sentiu o tranco e diminuiu o tom e o volume da birra. Segurei-o firme num desses abraços de judoca. E com ele dominado (embora continuasse chorando e berrando) pude digitar a senha e concluir a compra.

Num clarão repentino, num laivo, percebi que só tinha duas alternativas: sair correndo e deixar o João aos cuidados do gerente do Supermercado (pois já estava com o cartão) ou oferecer a ele uma saída honrosa para a birra (sem humilhações para nenhum de nós)

Pensei, enfim, que as alternativas não eram excludentes, desde que eu tentasse a saída honrosa primeiro. Foi o que fiz e até hoje é o que faço, porque dá muito certo.

A saída honrosa é nada mais nada menos do que uma mudança abrupta do foco da birra. Isto é, ao invés do pai ficar dizendo “João Pedro, não adianta gritar que eu não vou levar” ou “Olha só o que você está fazendo” ou “Agora que eu não levo nem os bombons” ou “Vou estrangulá-lo quando a gente chegar em casa”, entre outras coisas que as mães costumam falar, ao invés de ficar valorizando o descontrole da criança é muito mais simples surpreendê-la com uma sugestão ou um comentário inusitado do tipo: “João vamos pegar essas caixas de papelão do supermercado para fazer uma fogueira lá em casa?”

No mesmo instante ele parou de chorar e prestou atenção em mim. Aí pedi a ele que pegasse também mais umas sacolinhas de plásticos que pegam fogo fácil. E emendei uma hestória em que meu primo Fernando tinha pisado descalço num plástico derretido e teve que ir para hospital... Pronto, tudo sob controle novamente e pudemos voltar felizes da vida pra casa.

No caminho nem toquei no assunto da birra. Só quando fui tirá-lo da cadeirinha do carro, depois de estacionar em casa, é que falei olhando nos olhos dele: “Filho, acho que você se esqueceu que na nossa casa quem faz birra nunca consegue o quer. Mas agora você já se lembrou, né?”

Ele me fez um jóia com o dedo errado e fomos comer os bombons junto com a Mi.

2 comentários:

  1. Adorei Dú! Sabe que outro dia até pensei que talvez isso só acontecesse com o Enzo!
    È bom ver que acontece com as outras pessoas também, vou tentar essa tática já que as birras estão bem frequentes e incontroláveis.
    Não sei se estou menos tolerante ou se as coisas pioraram mesmo e aqui em casa birra também não tem vez!
    Haja paciência!

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  2. Dá super certo, e não vale só para a birra não, minha mãe me ensinou esta tática. Lembra aquele dia que o Antonio escorregou no SESC e tava chorando e a gente mudou o foco tirando uma foto dele no jacaré, vale também....

    Bjs "pros" quatro...

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